Cabo Cassol apresenta projeto de lei para proibir o "fura fila" no serviços públicos com uso de bebês reborn
Por Tribuna Foz dia em Notícias

LOUCURA
Cabo Cassol apresenta projeto de lei para proibir o "fura fila" no serviços públicos com uso de bebês reborn
A legislação simbólica como espetáculo político. Cabo Cassol parece cada vez mais inclinados a transformar a política em um palco teatral onde os atos simbólicos valem mais que ações concretas
A política brasileira tem passado, não raro, por episódios de profunda excentricidade legislativa. Um exemplo recente, que poderia ser classificado entre o cômico e o trágico, é o Projeto de Lei Nº 106/2025, apresentado pelo vereador Cabo Cassol (PL), de Foz do Iguaçu. A proposta visa proibir o uso de bonecas hiper-realistas - conhecidas como "bebês reborn" - como artifício para burlar o acesso a serviços públicos prioritários, como atendimentos médicos e filas preferenciais. À primeira vista, a proposta parece buscar proteger direitos coletivos e garantir o bom uso dos serviços. No entanto, uma análise mais aprofundada revela que estamos diante de um sintoma claro da chamada legislação simbólica, um fenômeno político que não resolve problemas reais, mas busca produzir efeitos midiáticos e eleitoreiros.
Afinal, qual é a real dimensão do "problema" que este projeto de lei tenta resolver? Onde estão os dados, os estudos, os registros oficiais que comprovem que esse tipo de prática - o uso de bonecos para furar filas - é uma ameaça concreta à ordem pública ou aos direitos sociais? Não existem. As poucas histórias que circularam são vídeos virais, descontextualizados, alimentados por um ciclo vicioso de manchetes sensacionalistas e moralismo digital. O que há, portanto, é uma construção social de um "inimigo imaginário", criado para satisfazer um público ávido por indignações fáceis e narrativas de "restauração da ordem".
A escolha do objeto de atenção política - uma boneca - e a ausência total de evidência empírica do problema mostram que esse projeto não passa de uma performance legislativa. O próprio Código Civil brasileiro já define que bonecos não são pessoas, portanto não possuem direitos. Ou seja, a legislação vigente já impede que se obtenham privilégios com base em um objeto. Fazer disso um projeto de lei específico revela mais sobre o desejo de visibilidade do autor da proposta do que sobre qualquer preocupação real com a moralidade administrativa ou justiça social.
É importante refletir sobre o que motiva esse tipo de atuação. Parlamentares do Partido Liberal, como Cabo Cassol, parecem cada vez mais inclinados a transformar a política em um palco teatral onde os atos simbólicos valem mais que ações concretas. Enquanto escolas lutam com falta de estrutura, hospitais enfrentam filas reais - com pessoas reais - e a população demanda melhorias urgentes em segurança, transporte e moradia, vereadores se ocupam em combater uma "epidemia de bonecos". Isso não é só ineficiência: é desprezo pelo tempo e pela inteligência da população.
Mais grave ainda é o impacto cultural e institucional dessa lógica. Quando representantes públicos utilizam seus mandatos para legislar sobre ninharias inexistentes, enfraquecem a legitimidade das instituições democráticas e reforçam a ideia de que a política é um jogo de vaidades. A proliferação desse tipo de legislação esvazia o verdadeiro papel do Legislativo, que deveria ser o de formular políticas públicas baseadas em evidência, em diálogo social e em compromisso ético com a realidade.
Por fim, a "loucura" a que o título deste texto se refere não está nas bonecas, nem nas poucas pessoas que eventualmente possam usá-las de forma inadequada. A verdadeira loucura está na inversão de prioridades que transforma objetos em ameaça nacional, enquanto ignora-se a complexidade dos problemas sociais. A sanidade política exige que retornemos ao básico: legislar para as pessoas, com seriedade, responsabilidade e verdade.
Esta é uma reprodução da matéria jornalística publicada pelo Jornal Tribuna Popular, Edição 416, Páginas 9, de autoria do Jornalista Enrique Alliana