Presidente da Câmara pretende dar mais de R$ 6 mil de gratificação por mês ao seu antigo sócio
Por Tribuna Foz dia em Notícias

IMORALIDADE OU SAFADESA?
Presidente da Câmara pretende dar mais de R$ 6 mil de gratificação por mês ao seu antigo sócio
A Câmara Municipal de Foz do Iguaçu e a gratificação de mais de R$ 6 mil para ex-sócio do presidente Paulo Debrito
Enrique Alliana - Jornalista
Na política brasileira, a fronteira entre o que é legal e o que é moral parece cada vez mais uma linha borrada, quase invisível. Em Foz do Iguaçu, esse limite vem sendo esticado até a beira do ridículo com mais um episódio que escancara como o poder público muitas vezes é tratado como propriedade privada. A nova “pérola” da Câmara Municipal atende pelo nome de Projeto de Lei nº 179/2025. Sob a fachada de “ajustar a valorização dos servidores cedidos à Câmara”, esconde-se um mecanismo engenhoso. Uma gratificação de até R$ 6.136,18 por mês para dois servidores que, por coincidência ou conveniência, têm ligações diretas com os donos do poder dentro da casa legislativa.
Sim, você não leu errado. Mais de seis mil reais mensais em “gratificação”. Dinheiro público, evidentemente, para dois servidores escolhidos a dedo. Até aí, talvez alguém tente justificar que se trata de reconhecimento pelo trabalho ou de equiparação salarial. Mas o problema é que os nomes dos beneficiados não são exatamente desconhecidos.
Um deles é Jefferson Cezar Bueno, ex-sócio do presidente da Câmara, Paulo Debrito. Como todos sabem, o Presidente da Câmara Municipal, Paulo Debrito é empresário e proprietário Centro de Formação de Condutores, denominado Auto Escola Debrito, mas também já foi proprietário da empresa CFC Simulador Foz, com nome empresarial Centro de Formação de Condutores Simulador Foz LTDA, com CNPJ 23.711.687/0001-79, onde constava que ambos eram sócios administradores da empresa.
O outro nome é Neura Ines Schussler, que também ocupa lugar na Mesa Diretora.
Caso clássico de favorecimento
Não é preciso ser Sherlock Holmes para perceber que estamos diante de um caso clássico de favorecimento. Se não bastasse o cheiro forte de imoralidade, o que se levanta aqui é uma suspeita legítima de uso da máquina legislativa para enriquecer amigos, aliados e até ex-sócios. É ou não é de se perguntar se a Câmara Municipal virou balcão de negócios particulares?
O teatro da legalidade
Como de costume, os envolvidos sempre têm um argumento pronto: “está tudo dentro da lei”. E, infelizmente, talvez esteja mesmo. O projeto, afinal, cria uma espécie de gratificação oficializada para servidores cedidos. A grande questão é? Por que só dois nomes aparecem na lista? E mais, por que justamente esses dois?
Quando um ex-sócio do presidente da Câmara aparece como beneficiário direto de uma medida criada pela Mesa Diretora, comandada pelo mesmo presidente, não é apenas um problema de aparência. É um conflito de interesse evidente. E quando o outro servidor é ligado a um vereador da própria Mesa, a impressão é que o poder legislativo está se tornando um condomínio fechado, onde se distribuem vantagens entre amigos.
O nome disso não é eficiência, tampouco valorização funcional. O nome disso é patrimonialismo. A confusão entre o que é público e o que é privado, velha chaga da política brasileira.
Imoralidade, ilegalidade ou safadeza?
Talvez o grande dilema esteja aqui. O que está acontecendo é ilegal? Dificilmente. A lei, como sabemos, é moldada com esmero para permitir esse tipo de manobra. A verdadeira questão é se isso é moral. E, no fundo, se não é apenas safadeza pura e simples com o dinheiro do contribuinte.
A população iguaçuense, que paga seus impostos em dia, é a mesma que sofre com o transporte coletivo precário, com a saúde pública em crise e com a educação abandonada. Em vez de respostas concretas para esses problemas, a Câmara parece mais preocupada em garantir gordas gratificações para figuras próximas ao seu presidente. A sensação é de que o interesse público foi jogado no lixo, substituído por pequenos arranjos pessoais e acertos de camaradagem.
IMORALIDADE OU SAFADESA?
O silêncio cúmplice dos demais vereadores
Até que ponto os representantes do povo estão dispostos a usar o cargo para beneficiar seus aliados, amigos e ex-sócios?
E os outros vereadores? Onde estão? O que dizem? Aparentemente, nada. O silêncio é ensurdecedor. Talvez porque muitos dependam da mesma lógica para sustentar seus próprios cargos e favores. Talvez porque seja mais fácil fingir que não viram nada. Afinal, quando se trata de defender privilégios, a solidariedade política é imediata.
E o eleitor, onde entra nessa história? O eleitor foi lembrado em outubro, na época do voto. Agora, parece ter sido arquivado junto com as promessas de campanha. A lógica que predomina é simples: eleição passou, estamos no cargo, o resto que se dane.
A memória do eleitor e a próxima eleição
O que os políticos de Foz parecem esquecer é que a memória do eleitor pode até ser curta, mas não é inexistente. Na legislatura passada, práticas semelhantes de favorecimento e descaso resultaram em um recado claro: dos 15 vereadores, apenas quatro conseguiram se reeleger. O famoso “cartão vermelho” foi dado sem dó.
A questão é: será que a população de Foz do Iguaçu aceitará calada mais essa jogada? Ou, em 2028, veremos mais uma renovação forçada do legislativo, com vereadores sendo expulsos pelo voto popular por confundirem dinheiro público com mesada para seus amigos?
A lógica da safadeza institucionalizada
No fim das contas, este episódio não é isolado. Ele faz parte de uma lógica mais ampla em que a política local, e diga-se, nacional, opera. A lógica do “é legal, mas não é moral”. A lógica do “todo mundo faz”. A lógica da safadeza institucionalizada, que se traveste de burocracia e de projeto de lei.
Enquanto o povo trabalha para pagar suas contas, a elite política inventa maneiras criativas de engordar o salário dos seus. E o mais curioso: fazem isso à luz do dia, em projetos públicos, sem medo de retaliação. Talvez porque confiem demais na indiferença da sociedade ou na amnésia coletiva.
O que está em jogo
O caso do Projeto de Lei nº 179/2025 coloca Foz do Iguaçu diante de um dilema. Não se trata apenas de saber se dois servidores merecem ou não receber uma gratificação de mais de R$ 6 mil. A questão central é: até que ponto os representantes do povo estão dispostos a usar o cargo para beneficiar seus aliados, amigos e ex-sócios?
Se a população aceitar passivamente mais este episódio, abre-se a porta para outros ainda piores. Hoje é um ex-sócio, amanhã pode ser um parente, depois um financiador de campanha. A linha da moralidade, já borrada, pode desaparecer de vez.
Portanto, não basta perguntar se o ato é ilegal. A verdadeira pergunta é: será que não passou da hora de o povo iguaçuense reagir? Será que não está na hora de exigir mais transparência, mais decência e menos safadeza?
Porque, convenhamos: se os vereadores acreditam que a Câmara de Vereadores é um palco para premiar amigos e ex-sócios, talvez estejam esquecendo que a plateia, um dia, pode levantar e vaiar. E quando isso acontecer, será tarde demais para pedir desculpas.